domingo, 7 de junho de 2015

15 INJUSTIÇADOS (Os melhores filmes do mundo – Parte 2)

Conforme deixei claro no artigo que fiz aqui no blog sobre os 21 melhores filmes do mundo (que, com menos exagero, deveria se chamar “21 dos filmes de que eu mais gosto”), todas as listagens de melhores filmes são fundamentalmente incompletas e subordinadas ao gosto pessoal daquele que as organizou.

Poe, em algum lugar, escreveu: “defino a poesia das palavras como Criação rítmica da Beleza. O seu único juiz é o Gosto”. Por extensão – e sem muitas digressões –, podemos dizer que toda a Arte está submetida, em essência, ao gosto pessoal. De fato, você não precisa ser muito erudito para compreender essa verdade (temo até que, quanto mais erudita a pessoa, menos ela entende isso!), e até uma humilde dona de casa iletrada questiona, com muita sabedoria, pelos ditos populares: “o que seria do amarelo se todo mundo gostasse do azul?”.

Assim sendo, é de se compreender a ausência de clássicos incontestáveis como Sindicato dos Ladrões, Cidadão Kane, Apocalypse Now e Crepúsculo dos Deuses naquela primeira lista. Em verdade, selecionei aqueles 21 filmes pensando justamente em fugir da rigidez das listas tradicionais e batidas que sempre colocam Cidadão Kane, O Poderoso Chefão, Um Corpo que Cai, Era Uma Vez em Tóquio e A Regra do Jogo no topo das melhores realizações na sétima arte. Tudo bem que esses longas-metragens são, certamente, alguns dos mais influentes e importantes da história cinematográfica – mas será que, só por isso, todo cinéfilo deve, necessariamente, achá-los os melhores filmes de todos os tempos? Eu acho que não. E, sinceramente, quem realmente acha divertido assistir a O Encouraçado Potenkin (filme que, sem sombra de dúvida, é um dos mais fundamentais para o desenvolvimento das técnicas de filmagem e montagem)?

Foi justamente para escapar desse engessamento artístico e intelectual que faz parecer que existe um manual imutável a ser decorado pelos cinéfilos (de modo que mais nenhum filme pode ser melhor do que aquelas obras-primas sagradas previamente estabelecidas) que fiz questão de não basear minhas escolhas na fama ou na importância dos filmes no universo do cinema – afinal, esse universo é muito maior e mais maravilhoso do que alguns críticos fazem parecer.

Abram suas mentes! Os melhores filmes não são apenas aqueles que estão nas apostilas de História do Cinema ou aqueles que o Scorsese e os velhos críticos indicam como tais!

Lembrem-se, cinéfilos: antes de Truffaut, nem todos os críticos gostavam de Hitchcock; antes de Baudelaire, quase ninguém gostava de Edgar Allan Poe. Mesmo hoje em dia, Tarantino fez muitos críticos olharem com olhos muito mais bondosos para os filmes-b e para os faroestes italianos subvalorizados e quase esquecidos.

Ainda assim, minha primeira lista foi injusta com muitas preciosidades do cinema. Para tentar compensar isso, trago, aqui, mais 15 dos melhores filmes de todos os tempos!

Novamente em ordem alfabética de acordo com os títulos nacionais, seguem os 15 injustiçados, tão bons e tão especiais quanto aqueles 21 iniciais:

01  2001: Uma Odisseia no Espaço (2001: A Space Odyssey, 1968)
É praticamente impossível transmitir em palavras toda a poesia que esse clássico absoluto de Stanley Kubrick cria em seus sons e imagens magistralmente orquestrados. Apesar de mais comentado do que realmente apreciado, 2001: Uma Odisseia no Espaço é uma das maiores obras de arte da humanidade, transcendendo as fronteiras do cinema para se tornar uma verdadeira força artística, filosófica e espiritual.

02  A Volta dos Mortos-Vivos (The Return of the Living Dead, 1985)
Punk até o osso, A Volta dos Mortos-Vivos é, ao mesmo tempo, uma divertida homenagem aos clássicos do George Romero e uma excelente evolução dos filmes de zumbi. Essa pérola dos filmes de mortos-vivos é cheia de cenas engraçadas e criativas, com muito sangue, tripas e cérebros (braaaaaiiinssss). Além do gore de encher os olhos e das situações inusitadas que ocorrem durante a trama, a cena do cemitério, com a belíssima scream-queen Linnea Quigley, entra facilmente para a lista das melhores cenas da história do cinema.

03  Alice no País das Maravilhas (Alice in Wonderland, 1951)
Sim, é isso mesmo. Você viu "A Volta dos Mortos-Vivos" e "Alice no País das Maravilhas" na mesma lista. Eu realmente gosto desse filme.

Diga o que quiser, mas essa animação surrealista baseada no livro de Lewis Carrol é uma das coisas mais malucas que existem na sétima arte. Apesar de a maior parte da magia do filme provir diretamente do livro que lhe deu origem, o resultado dessa animação é fantástico e cheio de sonhos e fantasias graciosamente loucos. Por acaso hoje é o seu desaniversário?

Obs.: o obscuro filme Alice, de 1988, criado por Jan Svankmajer, também deveria entrar nesta lista, mas sobre ele eu pretendo fazer uma resenha à parte, mais para frente, aqui no blog. Só para instigar a curiosidade, vai aí uma imagem.
Saudações do coelho branco.
04  Drive (Idem, 2011)
Visual impecável reforçado por uma trilha sonora que nos faz imergir em um mundo íntimo de nostalgia e introspecção – essa é a base que tornou a obra-prima de Nicolas Winding Refn um dos melhores filmes de ação dos últimos anos. As lindas cenas lentas em paisagens noturnas com iluminação exótica são contrastadas por momentos de extrema violência, os quais, a exemplo de Laranja Mecânica e dos melhores títulos de Sam Peckinpah, são poetizados e filmados com uma beleza de raro refinamento. Em uma palavra, Drive é foda!

05  Fome Animal (Braindead, 1922)
Assim como ocorreu em A Volta dos Mortos-Vivos, esse trash do Peter Jackson mistura sangues, tripas, desmembramentos e carnificinas extremamente criativas com um humor negro muito divertido e bizarro. Exageros e nojeiras fazem parte do filme, mas em nenhum momento ele se torna realmente repulsivo ou difícil de assistir. Na verdade, é como a imaginação brincalhona e hiperativa de uma criança inteligente criando um cartoon sobre atrocidades e massacres com zumbis. De longe, o melhor filme do diretor de O Senhor dos Anéis. Um prato cheio para quem gosta de ver os fatalities do Mortal Kombat!

Curiosidade: ao todo, foram usados mil litros de sangue falso para a realização de Fome Animal. Metade disso foi só para a cena do cortador de gramas.

06  Fugindo do Inferno (The Great Escape, 1963)
John Sturges dirigindo Steve McQueen, Charles Bronson, James Coburn e Donald Pleasence em um filme sobre uma incrível história real envolvendo a fuga de prisioneiros de guerra daquele que era considerado o mais seguro campo alemão durante a Segunda Guerra Mundial. Não poderia dar em outra coisa.

(Obs.: quis incluir Sete Homens e Um Destino – também do John Sturges – aqui, mas havia prometido que não incluiria faroestes nesse tipo de lista, senão elas seriam demasiadamente longas, já que sou fanático por westerns).

07  Lolita (Idem, 1962)
Um dos melhores filmes do Stanley Kubrick. Lolita é um road-movie extremamente cativante, permeado de humor negro e cenas bem filmadas. Ainda mais, o filme flui em um ritmo legal e possui uma estrutura narrativa diferenciada. Imperdível.

08  Mártires (Martyrs, 2008)
Possivelmente o filme mais violento que vi que não se limita apenas em mostrar cenas chocantes, brutais e angustiantes. Além da violência explícita que extrapola quaisquer limites, Mártires têm uma história muito original e explora questões complexas que nos fazem pensar durante muito tempo depois do enigmático desfecho do longa. Trata-se de um filme aflitivo ao extremo e com muitas reviravoltas. Não recomendado para quem tem nervos fracos! Pesadíssimo!

09  Morangos Silvestres (Smultronstället, 1957)
Esse clássico do Ingmar Bergman retrata a história de um professor de medicina idoso para fazer reflexões acerca da relação entre ciência e religião, das contraposições entre juventude e velhice, da aproximação da morte e do próprio significado da vida. Além de todos os méritos típicos dos filmes de Bergman, Morangos Silvestres tem extraordinárias cenas de forte simbolismo onírico que retratam, em uma abordagem freudiana, os medos, as aflições, os desejos e os traumas do personagem principal. Indubitavelmente, aqui estão algumas das melhores representações de sonhos no cinema.

10  O Estranho Mundo de Jack (The Nightmare Before Christmas, 1993)
Essa animação, baseada em um poema de Tim Burton e com forte influência dos trabalhos de Jan Svankmajer, não poderia faltar nesta lista. Com visual gótico-expressionista habilmente construído em figuras e cenários reais captados em stop-motion, personagens memoráveis, músicas fantásticas, ritmo ágil e uma história tocante, a história do vazio existencial de Jack Skellington e suas tentativas de superá-la é uma joia cinematográfica para crianças e adultos!

11  O Teorema Zero (The Zero Theorem, 2013)
Estética e trama extremamente inventivas e, em suas alegorias absurdas, permeadas de reflexões existenciais e críticas ao mundo, à sociedade, às pessoas, às tecnologias, às relações de trabalho, ao consumismo, à propaganda e a tantas coisas mais. Uma verdadeira indagação a respeito do significado da existência. Para mim, um Laranja Mecânica de nossos tempos. Uma mistura original e autoral entre Kubrick e Kafka.

12  Pacto de Sangue (Double Indemnity, 1944)
Melhor noir que já vi, com todos os elementos típicos do gênero: preto-e-branco, narração em off, detetives durões, femmes fatales, fumaça de cigarro esvoaçando por iluminação inclinada, reviravoltas, etc., etc., etc. Billy Wilder é um gênio ousado, o que é comprovado em Pacto de Sangue, mas, também, em Crepúsculo dos Deuses, Quanto Mais Quente Melhor, Inferno Nº 17 e em quase todos os outros filmes dos quais esse cara participou.

13  Pulp Fiction: Tempo de Violência (Pulp Fiction, 1994)
Esse cult do Tarantino dispensa apresentações. Se ainda não viu, veja e se divirta como poucas vezes você se divertiu em frente a uma tela de cinema ou televisão.

14  Stalker (Сталкер, 1979)
Confesso que, assim como aconteceu quando vi Solaris, do mesmo diretor (o genial Andrei Tarkovsky), não me lembro exatamente de todos os detalhes de Stalker, pois a experiência desse filme me deixou em um estado quase de transe, como se eu estivesse imerso em um sonho muito íntimo e brumoso. Como me lembro mais dos méritos de Stalker do que de Solaris, escolhi aquele, e não este, para constar nesta lista, mas ambos são igualmente maravilhosos.

15  The Grandmother (Idem, 1970)
O filme mais perturbador de David Lynch, na minha opinião. Esse curta-metragem obscuro e pouco conhecido foi feito ainda antes de Eraserhead. Para os doidos que gostam de coisas esquisitas, eis o filme completo:

--------------------------------------------------------------------------------------------------
E para você? Quais filmes você acha que ainda estão sendo injustiçados e não constam na lista? Eu já tenho alguns em mente! ;)
--------------------------------------------------------------------------------------------------
Clique aqui para conhecer a primeira parte da lista com os melhores filmes do mundo, aqui para conhecer a terceira parte e aqui para a quarta.

7 comentários:

  1. Muito boa essa lista, mais acessível que a outra ja que é um pouco menos cult, nao deixando de ter qualidade. Como o senhor mesmo disse, nao é porque não é famoso que deixa de ser bom.

    ResponderExcluir
  2. Eu simplesmente tentei não pensar na fama ou no status do filme na hora de fazer a lista. É claro que fama e status acabam me influenciando um pouco, ainda que de maneira inconsciente, mas o principal é o filme em si. Penso nos filmes que já vi e, conforme vou lembrando, vou selecionando os melhores. Fazer essas listas é como viajar dentro de mim mesmo com amigos de longa data, tirando fotos das paisagens mais memoráveis, hahahahaha

    ResponderExcluir
  3. Tem alguma sugestão de publicação aqui no blog, Paulo? Já estou programando aquela do Evil Dead que você falou, mas dicas são sempre bem-vindas! :D

    ResponderExcluir
  4. Já que o senhor perguntou... Como vossa graça tem um conhecimento um pouco maior de filme "cults", filmes mais artísticos por assim dizer, poderia fazer (se for de seu agrado) alguns texto falando de uns filmes e como e onde tais filmes revolucionaram o cinema. Fazer uma pequena critica e sinopse e falar mais da área artistica do filme, mostrando seus pontos principais e onde esses mudaram a cara do cinema. Assim, para o pessoal que não curte muito esse tipo de filme, assisti-los de forma mais critica desde o começo, para assisti-los não pensando na diversão mas em como tal obra afetou o mundo cinematográfico.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Boa ideia, Paulo! Nas críticas mais longas, de filmes mais "importantes", pretendo falar um pouco disso mesmo (acho que a função principal de qualquer boa crítica deve ser mostrar a importância do filme em determinado contexto), mas, em alguns casos, não dá para falar muito do filme sem revelar detalhes da trama (quando isso acontecer, ficarei quieto para não dar spoilers).

      Excluir
  5. Sanatorium per Klepsydra; A Laranja Mecânica; Malpertuis; A Noite dos Mortos Vivos (as 2 versões de George Romero, claro!).e o bizarro Reaninator (o primeiro filme, que o restante é muito ruim!). Também incluiria alguns com o genial Bella Lugosi, sobretudo o Gato Preto (adaptação do conto de Allan Poe) e o magistral La Alarma, da série "Historias para no dormir", do grande Narciso Ibáñez Menta, que se pode ver aqui: https://www.youtube.com/watch?v=_hE4d-ojqrs (E não se deixe enganar pelo tom humorístico do apresentador). Aliás, recomendo ainda as adaptações de Poe que o mesmo diretor fez: O coração delator, O caso do sr. Valdemar, aqui tem junto vários "contos" https://www.youtube.com/watch?v=ZaV6Uxk4iyQ
    Enfim, esses últimos são coisas para quem tem ouvidos para o espanhol, pois até onde sei não há legendas. De todo modo, ficam aí as indicações.
    Abraços!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Excelentes recomendações, Camilo! Acabei de assistir ao Sanatório Clepsidra (que até então eu não conhecia) e é realmente um filme fantástico! Muito obrigado pela sugestão!

      Também ainda não conheço os filmes do Narciso Ibánez Menta. Já vou procurar.

      Abração!

      Excluir